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Leituras

divulgação de livros; comentário de obras lidas; opiniões; literatura portuguesa; literatura estrangeira

Leituras

divulgação de livros; comentário de obras lidas; opiniões; literatura portuguesa; literatura estrangeira

Neste dia 25 de Abril, recordo dois poetas — três poemas: o antes e o depois de 1974

 

O longo sono

 

Depois da tempestade

o longo sono.

Os tributos. A fome. E o estrangeiro por dono

deste país que já não tem no nome

a independência da palavra liberdade.

 

Manuel Alegre, O canto e as armas, 1967

 

É preciso um país

 

Não mais Alcácer Quibir.

É preciso voltar a ter uma raiz

um chão para lavrar

um chão para florir.

É preciso um país.

 

Não mais navios a partir

para o país da ausência.

É preciso voltar ao ponto de partida

é preciso ficar e descobrir

a pátria onde foi traída

não só a independência

mas a vida.

 

Manuel Alegre, ib.

 

25 de Abril

 

Esta é a madrugada que eu esperava

O dia inicial inteiro e limpo

Onde emergimos da noite e do silêncio

E livres habitamos a substância do tempo

 

Sophia de Mello Breyner, O Nome das Coisas.

 

PRIMAVERA

 

As heras de outras eras água pedra

E passa devagar memória antiga

Com brisa madressilva e Primavera

E o desejo da jovem noite nua

Música passando pelas veias

E a sombra das folhagens nas paredes

Descalço o passo sobre os musgos verdes

E a noite transparente e distraída

Com seu sabor de rosa densa e breve

Onde me lembro amor de ter morrido

— Sangue feroz do tempo possuído

 

Sophia de Mello Breyner Andresen, Livro VI.

 


A terminar o dia, um poema de Sophia de Mello Breyner:

 

Senhor se da tua pura justiça

Nascem os monstros que em minha roda eu vejo

É porque alguém te venceu ou desviou

Em não sei que penumbra os teus caminhos

 

Foram talvez os anjos revoltados.

Muito tempo antes de eu ter vindo

Já se tinha a tua obra dividido

 

E em vão eu busco a tua face antiga

És sempre um deus que nunca tem um rosto

 

Por muito que eu te chame e te persiga.

 

in Mar Novo.