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Leituras

divulgação de livros; comentário de obras lidas; opiniões; literatura portuguesa; literatura estrangeira

Leituras

divulgação de livros; comentário de obras lidas; opiniões; literatura portuguesa; literatura estrangeira

Esther Friesner, Helena de Esparta Princesa de Ninguém, Bertrand, 2009, 298 páginas.

 

Mais um romance de tema clássico, este sobre a lendária Helena de Esparta, cujo rapto provocou a guerra de Tróia. 

 

A autora optou por nos dar uma visão diferente. Desta vez, não encontramos a conhecida história da rainha espartana, nem a sua partida para Tróia, nem a guerra entre gregos e troianos. Esther Friesner seguiu um caminho novo e ousado. Apresenta-nos uma jovem Helena que foge a todos os cânones da educação de uma rapariga espartana. Helena é atrevida, sem ser propriamente rebelde, é uma jovem que discorda do tipo de educação dada às mulheres, que foge para as montanhas para aprender a usar a espada como os seus irmãos, que usa todos os estratagemas para escapar dos enfadonhos trabalhos domésticos para os quais tem pouca habilidade. Helena, desde criança, mostra ter personalidade, ter ideias próprias, mostra que pensa sobre as coisas e dá a sua opinião, duvida das crendices sobre os deuses, embora os respeite, e quer ser livre de tomar decisões sobre a sua vida. Sabe-se que ela um dia será rainha de Esparta, mas, antes disso, a jovem Helena rege-se pela sua vontade e pelo desejo de aventura, pela ânsia de conhecer novos mundos.

Uma narrativa interessante, um tratamento divertido de alguns temas da cultura e civilização da Antiguidade, com a ironia dos tempos modernos.

 

 

Fernando Campos, A Rocha Branca, Alfaguara, Outubro de 2011, 246 páginas.

 

É o regresso de Fernando Campos às origens da sua formação académica — o mundo da antiguidade clássica, a língua e a cultura.

 

Desta vez é a poetisa Safo que inspira o autor. Num discurso cheio de poesia, com um apuro, uma delicadeza e uma riqueza de linguagem de que só este mestre é capaz, acompanhamos a poetisa Safo falando da sua vida, da sua poesia, dos seus amores.

Aliando o conhecimento histórico com a ficção, Fernando Campos descreve-nos os costumes da Grécia antiga, apresenta-nos personagens reais, mitológicas e fictícias, dá-nos a conhecer alguns poemas da poetisa de Lesbos e introduz canções da sua própria autoria. A língua grega aparece nos poemas acompanhada de tradução, dando-nos, desse modo, uma maior riqueza histórica e cultural.

Os locais são descritos em pormenor, sentimo-nos lá, presentes.

E Safo, o amor, a paixão percorrem este romance, cheio de mistérios, de crenças no sobrenatural, de poesia.

Uma leitura que encanta, que nos mostra como se pode usar a língua e a sua riqueza lexical com todo o rigor e propriedade.

 

Os grandes clássicos, sempre atuais:

 

" Nas grandes empresas, é difícil agradar a todos."

 

Sólon, ateniense, grande legislador, séc. VI a.C.

in Antologia da Poesia Grega Clássica, trad. e notas de Albano Martins, Portugália Editora, 22010.

Uma fábula de Esopo

 

Os golfinhos, as baleias e o cadoz

 

Os golfinhos e as baleias estavam em guerra. Como a luta se prolongava e tornara encarniçada, um cadoz (é um peixe pequeno) veio à superfície e tentou reconciliá-los. Então um golfinho, tomando a palavra, disse: "É menos humilhante, para nós, combater e morrer uns pelos outros que aceitar-te como mediador."

Assim, há homens que nada valem, mas que, vivendo em épocas de agitação política, julgam que têm algum valor.

 

Esopo (século VI a.C.), in Antologia da Poesia Grega Clássica, trad. e notas de Albano Martins, Portugália Editora,22010.

 

     VIERAM

com os galões dourados

     os galos do Norte e as feras do Levante.

E tendo repartido em duas a minha carne

     acabaram por se disputar pelo meu fígado

e foram-se.

     "Para eles", disseram, "o fumo do sacrifício,

para nós os fumos da glória,

     amén."

E o som enviado do passado

     todos o ouvimos e conhecemos.

Conhecemos o som e de novo

     de voz apertada cantámos:

para nós, para nós o ferro ensanguentado

     e a traição triplamente urdida.

Para nós a madrugada na caldeira

     e os dentes cerrados até à hora derradeira,

e o dolo e a rede invisível.

     Para nós o rastejar na terra,

a jura escondida na escuridão

     dos olhos, a crueldade,

sem nenhuma, nunca nenhuma Contrapartida.

     Irmãos enganaram-nos!

"Para eles", disseram, "o fumo do sacrifício,

     para nós os fumos da glória,

amén."

     Mas tu na nossa mão a candeia das estrelas

com a tua fala acendeste, boca do inocente,

     porta do Paraíso!

A vigência do fumo no futuro vemos

     jogo da tua respiração

e seu poder e reinado!

 

                        de Louvado Seja (Áxion Estí), tradução portuguesa e posfácio de Manuel Resende, Assírio e Alvim, 2004.

 

Odysséas Elytis é um poeta grego falecido em 1995. Recebeu o prémio Nobel em 1979.

Áxion Estí, publicado em 1959, é um poema nacional no qual o poeta, inspirado na tradição, revê a história da Grécia com todas as suas vicissitudes e anseia por um renascimento. E, como ele disse no Discurso do Prémio Nobel:

 

"No fundo, o mundo material é um puro amontoado de matéria. A construção final depende da nossa qualidade de arquitectos. O paraíso ou o inferno. Se a poesia contém uma garantia e isto nestes tempos sombrios, é precisamente esta: que o nosso destino, apesar de tudo, está nas nossas mãos." In Posfácio a Áxion Estí de Manuel Resende.