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Leituras

divulgação de livros; comentário de obras lidas; opiniões; literatura portuguesa; literatura estrangeira

Leituras

divulgação de livros; comentário de obras lidas; opiniões; literatura portuguesa; literatura estrangeira

João Tordo, O Ano Sabático, D.Quixote, Janeiro de 2013, 205 páginas.

 

" Uma vez, num dia especialmente difícil, Hugo foi procurar a um dicionário a definição de fracasso. Leu palavras que nunca usava: malogro; ruína; estrépito. Nessa tarde, deitado na cama do apartamento de Saint-Henri, deu-se conta de que não conseguiria tocar nessa noite."

 

Hugo é um músico, toca contrabaixo, que despertou já tarde para essa vocação. Vive no Canadá há uns anos, onde se entrega a excessos, na busca de um sentido para a sua vida, sentido que não encontra. Decide então regressar a Lisboa, vai para casa da irmã gémea, para, segundo ele, tirar um "ano sabático", um ano em que não toca, nada faz, em que espera encontrar a paz desejada e as respostas para as suas interrogações.

Mas este regresso a casa vai transformar-se num tormento ainda maior, a partir da noite em que assiste a um concerto de um pianista, que ele não conhecia, mas que estava com grande sucesso. É que, no meio das composições dessa noite, o pianista toca uma música que Hugo andava há muito a compor e ainda não tinha conseguido terminar. Como podia aquele desconhecido conhecer a música que apenas existia no seu pensamento?

Hugo entra, então, numa busca desesperada, procura o pianista, procura uma resposta. Será ele o seu irmão gémeo que morreu apenas com algumas horas de vida?

Esta é a narrativa de um homem em busca do seu EU, um eu incompleto e que nunca chega a alcançar a plenitude, um eu em busca da sua outra metade. Esta angústia leva Hugo à loucura e ao suicídio, depois de, no seu íntimo, ter matado o outro, o pianista Stockman.

 

O livro é dividido em duas partes.

Na segunda parte é o narrador/autor que nos fala do seu amigo, o pianista Luís Stockman, e da forma como ele, depois de ter lido uma carta que Hugo escreveu antes de se suicidar, viaja para o Canadá, em busca de uma resposta para tudo o que se passou.

Nesta segunda parte o narrador/autor, constrói connosco a sua narrativa, apresenta-a como real, tendo mudado apenas os nomes das personagens, e, através das cartas e telefonemas do seu amigo, vai contando uma outra história que encaixa na primeira e parece completá-la.

 

Um romance fora do comum, uma narrativa que nos intriga a princípio, mas que nos toca profundamente e nos faz ler até ao fim; a narrativa de um homem e do seu duplo, o ser incompleto que procura o seu eu mais profundo.

Madeline Miller, O Canto de Aquiles, Bertrand Editora, 2013, 342 páginas.

 

Uma moderna narrativa da lenda. A perspectiva é a de Pátroclo, o companheiro inseparável de Aquiles, que nos conta como se conheceram, como se apaixonaram, como foi a sua (deles) vida, até à morte de Aquiles.

Uma forma romanceada de contar a lenda, em grande parte a narrativa da Ilíada de Homero, sob um outro ponto de vista, mas mantendo a fidelidade às versões que a tradição e os escritores antigos nos deixaram.

Numa convivência entre os humanos e as divindades, assistimos aos encontros de Aquiles com sua mãe, Tétis, às tramóias dos deuses, às vinganças e às intervenções de Zeus, numa naturalidade de relação entre os homens, os deuses e os centauros.

É uma história de guerra, de heróis, mas também de seres humanos sensíveis, que não percebem as guerras e a morte de outros homens. E é, essencialmente, uma história de amor, de paixão levada aos limites, na reacção de Aquiles após a morte de Pátroclo. Aquiles, aqui tratado como humano, mas convivendo com sua mãe, a deusa marinha Tétis, é um ser humano normal, com sentimentos, um jovem que age como os outros jovens, mas também o jovem que sabe qual é o seu destino, que tem consciência da sua superioridade em relação aos outros homens e que, a determinada altura, sabe fazer uso dessa sua superioridade.

Depois de vaguear nas sombras, Pátroclo recebe, finalmente sepultura, e é Tétis que toma essa iniciativa:


"A princípio, não a percebo. Ma depois vejo o túmulo e as marcas que ela gravou na pedra. AQUILES, está escrito. E, ao lado, PÁTROCLO.

— Vai — diz ela — Ele está à tua espera.


Na escuridão, duas sombras avançam uma para a outra através das trevas densas e desoladas. As suas mãos encontram-se, e a luz jorra num dilúvio, como uma centena de vasos de ouro a derramarem o sol. "


A obra foi Best-seller do New York Times e vencedora do Orange Prize de 2012.



Hélia Correia, A Terceira Miséria, Relógio d'Água, 2012, 39 páginas.

 

33 poemas, uma reflexão sobre a Grécia — a sua grandeza, a sua história, as suas derrotas, o estado actual.

 

 

Poema 30

 

Para onde olharemos? Para quem?

Certo é que Atenas se mantém oculta

E de algum modo intacta, por debaixo

Do alcatrão, do ferro retorcido.

Certo é que nunca ressuscitará

Visto que nada ressuscita.