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Leituras

divulgação de livros; comentário de obras lidas; opiniões; literatura portuguesa; literatura estrangeira

Leituras

divulgação de livros; comentário de obras lidas; opiniões; literatura portuguesa; literatura estrangeira

Pascal Mercier, Comboio nocturno para Lisboa, Dom Quixote, 2008, 2ª ed., 423 páginas (edição original, Munchen, 2004).

 

Interessante romance que integra o percurso da personagem principal e os textos de uma segunda personagem central, procurada pelo anterior.

Vejamos: um professor de línguas clássicas (latim e grego e ainda hebraico), Gregorius, conhecido entre os seus alunos e colegas como o Mundus, o Papiro, resolve deixar tudo e partir para o desconhecido, em busca do autor de um livro que o fascinou. Gregorius, professor em Berna, depois de um inesperado encontro com uma mulher, que lhe disse ser portuguesa, depois do contacto com um livro do português Amadeu do Prado, nunca mais é o mesmo. O grande erudito das línguas clássicas, que sabia de cor os textos dos melhores autores gregos e latinos, decide mudar de vida. Deixa a escola inesperadamente, procura um curso de português e mete-se num comboio até Lisboa à procura do autor desse livro. Ao chegar a Lisboa procura saber tudo sobre o autor do livro, que já tinha falecido há 30 anos. Encontra familiares, amigos, o liceu onde ele estudou, de todos procura saber algo mais sobre este português de uma família aristocrática e envolvido nas lutas contra o regime de Salazar.

É uma época da história de Portugal vista por um estrangeiro, com personagens portuguesas, com passeios pelas ruas da capital, dando-nos a conhecer aspectos políticos e sociais que caracterizaram uma época, mostrando-nos a forma como é recordada, anos após a revolução de 1974, por aqueles que viveram a opressão, a resistência, a tortura.

Assistimos a uma reflexão e a uma descrição do pensamento, das dúvidas, dos complexos problemas do português Amadeu do Prado, mas também da problemática interior do próprio Gregorius, que em muitos aspectos se identifica com a personagem que ele procura conhecer em pormenor. Na busca de si próprio, na procura do seu verdadeiro caminho, Gregorius vive intensamente os problemas do médico português, Amadeu do Prado, revisita todos os lugares por ele frequentados, convive com aqueles que o conheceram.

Um interessante romance, narrativa de duas vidas, um discurso que se lê com interesse a cada página.

 

— Com base neste livro está a ser rodado um filme em Lisboa. Esperemos que ele saiba transmitir toda a riqueza psicológica destas personagens.

 

— Alguns reparos para a tradução: para além de alguns erros menores, e outros que podem ser considerados "gralhas", há dois erros que são graves e imperdoáveis. Em várias passagens da obra aparece "eminente" quando devia estar "iminente". O tradutor desconhece a diferença entre os dois vocábulos: fala de "morte eminente" quando devia escrever "morte iminente", quer dizer, que está prestes a acontecer (diferente de "eminente" que significa notável, que se destaca pela sua importância). O que é grave é que isto não aparece apenas uma vez mas muitas vezes. Um outro erro, também grave, aparece na página 399 onde se lê "E com aquele estranho,... , ela não queria ter nada a haver" — quando devia dizer "não queria ter nada a ver".

É pena que a língua portuguesa seja assim maltratada numa obra literária.